TAL PAI, TAL FILHO
Conheci João Nogueira quando ele foi contratado pela gravadora Odeon como umas das maiores promessas da música brasileira, o que foi confirmado mais tarde.
Ficamos amigos, pela convivência na gravadora e pelas “discussões” sobre futebol, ele flamenguista “doente”e eu tricolor “sofredor”.
Certa vez ele me convidou pra tomar uns “tragos”. Apareceu com um litro de uma batida de frutas e fomos ao meu apartamento em Ipanema “degustar”o líquido precioso.
Entre papos, violão e histórias, “matamos” a garrafa.
Eu, pouco acostumado a bebidas fortes, “apaguei” e acordei no chão da portaria do edifício, com o João me sacudindo e me chamando pelo nome.
Não era nada grave. Era “porre”mesmo
Depois desse dia passei a considerar o João não apenas um grande artista, mas também um amigo.
Muitas vezes fui à sua casa.
Sua mulher Ângela ficou amiga da Evelise, minha mulher. Assistimos ao crescimento das crianças, Diogo, Tatiana e Clarisse. Uma noite resolvemos compor um samba e, modéstia à parte, saiu um bom samba: "Bicho Homem", uma música para falar da condição do ser humano de predador da natureza.
João gravou e eu também.
Nossa amizade continuou firme, mesmo com encontros esporádicos.
Um dia ele começou a aparecer no campo do Chico ( Buarque ), onde jogávamos nossas “peladas”( de vez em quando ele participava ) e nossa amizade se firmou mais ainda.
Quando ele nos deixou, ficamos todos órfãos de um amigo e a música brasileira de um talento único.
Certa vez, estávamos nos preparando para jogar, quando ouvi uma voz: “E aí, rapaziada?
Tomei um susto. Era voz do João. Quando olhei para a porta, lá estava seu filho Diogo.
Ele me viu: Tio!
Eu: Dioguinho!
Nesse abraço voltei muitos anos, quando ele era um menininho franzino que eu pegava no colo.
Agora ele era um homem feito e um nome já consagrado no mundo do samba.
Fiquei sabendo que ele havia tentado o futebol, mas uma contusão no joelho acabou com seus sonhos.
Pior para o futebol, melhor pra nós.
Ele ficou jogando com a gente durante um bom tempo, depois sumiu.
Só ficávamos sabendo dele pelas notícias do seu ( merecido ) sucesso.
Quando decidi lançar o CD “Silvio Cesar & Boa Cia., uma coletânea de alguns duetos que eu havia gravado ao longo da carreira e entre eles um com o João – o samba “Companheiro”, convidei o Diogo para participar.
Cantamos juntos o samba “Dois amigos”, que eu havia gravado alguns anos antes com o Miltinho.
Na gravação aconteceu uma coisa surpreendente:
Quando Diogo abriu a boca e soltou o vozeirão, o Castelo Estúdio, em Niteroi, tremeu.
Mesmo depois de pedir ao Diogo que se afastasse um pouco do microfone, ou diminuísse a intensidade da voz, o técnico de som Carlos Machado, teve um trabalhão pra conseguir um bom resultado.
Mas conseguiu.
Diogo gravou 3 vezes e se despediu.
Quando ele já estava na porta da saída, chamei-o num canto e falei: "Dioguinho, tem umas notas meio sem definição”. E ele: “Esquenta, não, Tio. O técnico conserta.
E foi embora. Eu fiquei ali, analisando minha geração, cheia de cuidados com a afinação, precisão nas palavras, emissão das notas, etc., etc. e pensei na geração do Diogo, expontânea, natural, confiante na tecnologia.
E ele estava certo.
As máquinas corrigiram todas as distorções e a gravação ficou muito boa.
*Quem quiser conferir, é só dar uma olhada em Lançamentos > Silvio Cesar & Boa Cia. e clicar na faixa.
Pra encerrar:
Que bom que a obra e o nome do João Nogueira continuam vivos, na voz de seu filho Diogo.
Os dois são a confirmação perfeita do ditado popular:
TAL PAI, TAL FILHO.
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